A maldade essencial
- Simone Demolinari
- 24 de out. de 2019
- 2 min de leitura
É comum pensarmos que a prática do mal é algo que ocorre de forma deliberada, ou seja, um indivíduo escolhe ser ruim. Essa é uma questão muito delicada e que requer uma reflexão mais profunda. Não podemos deixar de considerar a escolha de uma pessoa em ter uma conduta cruel ao mesmo tempo que também não podemos deixar de conceber a existência de uma personalidade perversa inerente àquele indivíduo. Entender a perversidade não é algo simples. Há uma fábula que ilustra bem essa conduta: “Certa vez, um escorpião com medo de ser levado pelas águas do rio solicitou gentilmente ao jacaré que o ajudasse a chegar até a outra margem o levando nas costas. O jacaré, conhecendo a conduta traiçoeira do escorpião, recusou o pedido sob a justificativa de que poderia ser picado por ele. O escorpião se sentiu ofendido com tal recusa. E indignado com a desconfiança do jacaré, disse: “Você acha que eu faria isso com você? Jamais picaria alguém que se prontificasse a me ajudar. Ao contrário, serei eternamente grato se você me ajudar a atravessar o rio, pois salvará a minha vida”. O jacaré se sentiu culpado em não prestar esse favor e, convencido de que o escorpião não lhe faria mal, cedeu-lhe o lombo e o transportou. Ao chegar do outro lado do rio, o escorpião lascou uma picada no jacaré. O jacaré ficou perplexo e prontamente indagou: “Mas escorpião, por que você fez isso com quem só lhe ajudou”? O escorpião respondeu calmamente, sem demonstrar sinal de remorso: “Jacaré, eu realmente sou grato a você e nunca esquecerei esse favor que você me prestou, mas não consigo deixar de te picar pois essa é minha natureza”. Essa fábula nos traz a triste realidade de uma pessoa que, mesmo querendo, não consegue frear sua conduta cruel. Embora seja difícil acreditar, precisamos aceitar o fato de que existem pessoas essencialmente ruins. Tapar o sol com a peneira não muda os fatos. Há momentos na vida em que o melhor a se fazer é aceitar a realidade como ela é. O indivíduo de má índole não o é por uma simples opção. São pessoas com ausência de consciência moral, ética e sem nenhuma empatia pelas pessoas que prejudica. Aliás, o outro não é considerado, apenas seus próprios interesses. O que significa que alguém perverso não planeja ser ruim, simplesmente é sem fazer esforço algum. É uma maneira natural de agir. Tendo em vista essa condição, seria correto afirmar que ele não tem culpa das atrocidades que comete? Não. Essa afirmativa não é correta. O perverso, mesmo agindo de forma natural, tem plena consciência da própria conduta. Não lhe falta clareza dos fatos, lhe falta freio moral. Suas atitudes, mesmo ocorrendo de acordo com sua natureza, não anulam o discernimento da crueldade dos seus atos. Ele sabe que prejudica os outros, mas simplesmente não se importa. Essa é a maldade na essência.




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